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Como Oklahoma! redefine a função de revivals


O tão aclamado revival da Broadway de Oklahoma!, de Rodgers & Hammerstein, com direção de Daniel Fish, chegou os palcos londrinos em 2022 no teatro Young Vic, numa proposta intimista e imersiva. E, depois de uma temporada de sucesso, foi transferido para os palcos da West End, no Wyndham’s Theatre. Muito é dito sobre o quão revolucionária é essa montagem, então fomos conferir a montagem londrina, e podemos dizer que é sim tudo isso e muito mais.


Oklahoma! é considerado por muitos o primeiro musical com texto completo criado. Sua trama gira em torno de dois triângulos amorosos entre a tradição e o estrangeiro. O primeiro é entre Laurey e Curly, um casal que nitidamente tem interesse um pelo outro desde o início, porém, nenhum dos dois admite isso, e Laurey acaba saindo com o temido Jud, para deixar Curly enciumado.


O segundo núcleo gira entorno de Ado Annie, uma jovem que é apaixonada por dois homem, o primeiro é Will, que é louco para casar com ela, e o segundo é Ali, que faz de tudo para fugir de um casamento. Após o pai da Ado Annie pegar ela com Ali, ele força Ali a casar com ela. Então, Ali começa a trabalhar junto de Will para fazer o pai mudar de ideia.


Apesar de ser considerado um dos grandes clássicos do Teatro Musical, o espetáculo envelheceu extremamente mal e possui por si só um texto extremamente misógino, e machista. Tendo isso em vista, a direção de Daniel Fish, dessa produção atual, propõe escancarar todos esses problemas e subverter completamente os valores do espetáculo original, numa montagem extremamente provocativa e viceral, redefinindo os paradigmas para se fazer um revival.


Logo no primeiro minuto você já percebe que tem algo muito estranho, quando Curly começa a cantar “Oh, what a beautiful morning” sem demonstrar a mínima alegria ou sentimento contido na letra, pelo contrário, ele só demonstra uma mistura de tristeza e indiferença ao cantar. Essa música já define de cara o tom desse núcleo, e explícita, para aqueles que não sabiam o que esperar, que esse não é um Oklahoma tradicional.


E a tensão desse núcleo só vai aumentando com o passar das cenas, com o Curly sendo pintado dessa vez como um vilão, ao invés de herói, e o Jud como uma vítima, e não vilão. O ápice dessa tensão ocorre na cena em que Curly sugere para Jud que ele cometa suicídio. A cena que é tão problemática no original dessa vez é feita completamente no absoluto escuro, desorientando completamente a plateia, e deixando ainda mais desnorteante, e desesperador.


Por outro lado, o núcleo da Ado Annie traz um contraponto bem poderoso, com uma leveza e muito humor, fazendo com que os três personagens sejam apaixonantes, e que todo o público torça para que Ado e Will fiquem juntos no final. Mas mesmo assim, o núcleo não deixa de ser menos subversivo do que o outro, uma vez que nas montagens anteriores a Ado Annie foi sempre posta como uma garota errada, sem moral, dessa vez ela é representada com muito orgulho de ser quem ela é, e diverte o público com essa personalidade peculiar dela.





E é lógico, tudo isso só é possível de ser atingido com um elenco fenomenal. Arthur Darvill venceu o Olivier Awards deste ano, de melhor ator, com sua performance brilhante como Curly. Patrick Vail foi importado do elenco da Broadway para interpretar Jud em Londres também, e é fácil entender o motivo, sua interpretação extremamente complexa do “vilão”, faz com que ele ganhe a simpatia do público desde o primeiro minuto, ao entregar todo o coração ao personagem. Junto do Patrick, James Davis também foi trazido da Broadway, para interpretar Will, numa leitura única do personagem, deixando o Will extremamente divertido e engraçado, mesmo com sua lerdeza. E claro, Paggie Paddie, que acabou de assumir o papel de Ado Annie, não fica para traz, sua performance como Ado Annie é apaixonante, fazendo com que seu solo “I Can’t Say No” seja um dos pontos altos do musical.


Um dos charmes dessa montagem é que mesmo agora em palco italiano, o espetáculo ainda apresenta resquícios da montagem imersiva, então se você sentar na primeira fileira, pode acontecer de algum personagem flertar com você, ou até levar uma enxurrada de água.


Oklahoma! prova que o papel de um revival não deve ser apenas reproduzir o que já existiu num passado para novas gerações terem contato, mas sim, trazer novas questões e análises, se adaptando com a época que é encenado. Oklahoma! é nada menos do que uma aula de teatro musical, imperdível para qualquer um que tenha a chance de assistir.




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